11 de mar. de 2016

LOBÃO - O Rigor e a Misericórdia



Por Natan Castro

Lobão é reconhecidamente um talentosíssimo multi-instrumentista, de todos os instrumentos de corda somente o baixo o músico ainda não havia se aprofundado nos estudos, algo que aconteceu em o Rigor e a Misericórdia. A concepção desse disco é um sonho antigo de criar um álbum seguindo o estilo One-Man, que nada mais é que realizar todo o processo de produção de um disco completamente sozinho. O disco está calcado na sonoridade do rock setentista período que Lobão conhece com propriedade, suas principais referências vem de lá com nomes como Grand Funk Railroad e Led Zeppelin, logo nos primeiros instantes de Overture o tema de abertura do álbum, podemos sentir algo de épico no ar, algo que se faz perceber durante todo o disco, o acetato sonoramente está entre o hard rock setentista e o Arena Rock do inicio dos anos 80, tudo isso se constata quando Lobão abre um baú de acordes in virtuose, com nossos elogios aos interessantes solos de guitarras, sempre muito bem imaginados em timbres muito bem encaixados por sinal, exímio baterista, ele em algumas passagens chega a exagerar nas viradas, saturando o papel da bateria no andamento de algumas músicas. Não há dúvidas que o Rigor e a Misericórdia é um grande disco, o amadurecimento de Lobão referente às letras com o passar dos anos ficou visível, aos poucos Lobão deixou de lado as parcerias do passado com letristas e passou a forjar a partir de suas leituras um letrista dentro de si. Saber traduzir e transpor todo o arcabouço literário que ele nunca escondeu de ninguém como parte integrante de suas músicas, é algo que o diferencia de muitos no meio, foram poucos os letristas de um Brasil recente que transformaram reflexões criticas do cotidiano em grandes canções como A marcha dos infames, A posse dos Impostores, Os vulneráveis e O rigor e a Misericórdia, essas quatro músicas conseguem ter uma profundidade político-social que em contrapartida não encontramos num “Nhengattu” do Titãs, outro grande disco de rock de teor político do Brasil contemporâneo. 


O Rigor e a Misericórdia num campo estético traduz o momento apocalíptico e crucial que a democracia brasileira passa, não fosse somente isso ele é um dos pontos altos da carreira de um artista que vem com o passar dos anos realizando uma espécie de passagem para um estágio visceralmente oposto ao anterior. Lobão conseguiu transmutar uma imagem de roqueiro tresloucado sem papas na língua, para uma espécie de “gurú” de uma leva cada vez maior de artistas independentes, junte-se a isso sua luta por direitos autorais e sua persona on-line recheada de apontamentos críticos aos negros anos do PT a frente da direção da nação. Esse novo momento inclusive é muito parecido, mas claro guardadas as devidas proporções, com a fase de John Lennon de Nova York.  Lobão nesse disco só peca quando suaviza o discurso, em canções de teor idílico, recheadas de imagens poéticas que constratam totalmente com o restante das músicas, ao que nos parece apesar desse profundo amadurecimento o artista ainda não consegue dosar as duas coisas, algo que era marca de outros grandes nomes que surgiram nos anos 80. No mais o disco representa os primeiros instantes da chegada da fênix a um Brasil quase brilhante de luz, mas ainda repleto do fogo negro das ideologias retrógradas.


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